terça-feira, 18 de julho de 2017

EXPEDIÇÃO: MOTORFORT 4x4 - DA AMAZONIA AO PACIFICO PELA INTEROCEANICA -2005


13/12/2005 a 12/02/2006
Troller T4 2004
Diego Rosa

A Expedição Motorfort 4x4 foi capa da revista Oficina Mecanica


Difícil livrar-se de um rotulo !
  não que eu queira, gosto de ser conhecido como aventureiro, mas, amigos me pediram pra postar aventuras, mesmo que seja no blog de motos clássicas, dizem que falar do autor e esquecer-se desta faceta estaria deixando uma lacuna enorme no Blog. E não é que eles não estavam de todo errados ?  notei pelas estatísticas do blog que as aventuras de moto tem mais acesso do que as motos dos anos 80. Talvez pela proximidade com as férias de verão, talvez pela curiosidade, por sair do comum, por transportar cada um dos leitores em uma aventura, despertando o aventureiro que está dentro de todos nós...  Mas, assim sendo, tomo a liberdade de publicar outra aventura, desta vez com um jipe, e pra variar saindo do lugar comum... ha 8 anos, quando a "Rodovia Transoceanica" (estrada que liga a Amazônia ao pacífico, cruzando a cordilheira peruana) ainda era toda de terra e começavam a fazer as primeiras obras, no tempo em que a travesseia da fronteira Brasil x Peru em Assis Brasil no Acre era feita atravessando-se o rio, por dentro d'agua como fiz, ou em precárias balsas que lá haviam...  enfim, fora do lugar comum também, pois jipeiros são essencialmente seres que se agrupam, seja para viajar, seja para fazer uma trilha, nunca se vê um jipeiro viajando sozinho...  ops !  nunca ?  essa palavra é forte demais !  mantendo a tradição de viajar exclusivamente sozinho, assim foi feito.  E quer saber ? os jipeiros estão cobertos de razão por quererem viajar em grupos - os jipes quebram - e quando quebram é que a coisa pega pra valer !  bem, mas isso deixo para que vocês acompanhem no relato abaixo...uma viagem que era pra durar 25 dias e que durou 62 dias ! Cerca de 26.370 kms rodados ( 12.000 km de avião,  4.300 km de carona em caminhões, 6.000 km de jipe, 3.460 km de ônibus de linha, 600 km em uma pick-up alugada   ahhh peço desculpas também por usar o termo "Expedição" para uma viagem que fiz sozinho, estava empolgado, era minha primeira viagem de jipe e queria me enturmar.  Como o jipe estava adesivado, em algumas cidades pessoas me perguntavam onde estavam os demais jipes da expedição, e eu dizia que eles "estavam vindo"....  era a explicação mais simples a ser dada!



Para os que viajam, que sirva de guia, muito embora o trecho mais "nervoso" da viagem (entre Rio Branco e Cuzco) esteja atualmente todo asfaltado, serve como referencia e para que saibam como era antes do conforto do asfalto!  para os que não viajam fisicamente, que curtam a viagem na leitura!  Boa diversão!


A viagem era pra ser feita toda de jipe, mas imprevistos aconteceram e voltei na boleia de um caminhão, mas não sem antes voar para São Paulo, voar de volta a Lima, viajar de ônibus, carro alugado...  era 13 de dezembro de 2005 e a diversão estava apenas começando:


13.12 – Atibaia, SP – Campo Grande, MS - 1.080 km
A viagem foi tranquila até Campo Grande, o jipe todo revisado estava uma delicia, rendeu muito bem com media de mais de 10 km/l de diesel. Final da tarde estava em Campo Grande.

14.12 – Campo Grande, MS – Cáceres, MT - 940 km
Justamente no pior trecho desse trajeto, na serra que existe antes de Cuiabá, desabou uma forte chuva de verão, deixando a estrada ainda pior. Muitas carretas e alguns buracos nesse trecho. Uma Honda CBR900RR passou por mim, comentei comigo mesmo que achava que ele estava andando forte demais pras condições daquele trecho – logo mais a frente, a moto caída! Felizmente o motociclista estava ao lado da moto e parecia não ter sofrido nada. Minha idéia era dormir em Cuiabá, mas eram 15:30hs quando atravessei a cidade e resolvi tocar mais alguns quilômetros, até o sol se pôr. Cáceres fica bem próximo a divisa da Bolívia, encontrei um hotel a beira da estrada, comi um pastel numa feira e fui dormir, o calor era insuportável. Mais tarde, em Porto Velho me informaram que era a cidade mais perigosa da região, pois muitos carros e caminhões eram roubados ali e transferidos pra Bolívia. Sorte que eu não sabia disso, assim viajei despreocupado!

15.12 – Cáceres, MT – Porto Velho, RO - 1.250 km
As estradas são excelentes nesse trecho, longas retas, planas, com asfalto em boa condição, praticamente sem movimento algum nessa época do ano. Final da tarde estava em Porto Velho, que fica as margens do rio Madeira e era justamente onde começava a estrada de ferro Madeira Mamoré. Outra curiosidade é que apesar de estar longe de qualquer oceano, Porto Velho possui um porto fluvial que é responsável pelo embarque de cereais e cargas, pelo Rio Madeira e posteriormente pelo Amazonas até Belém, PA, onde as cargas são transferidas pra Transatlânticos e conseqüentemente para Europa e USA.  O Troller é uma maquina de comer quilômetros !  em 3 dias ja ficaram pra trás 3.270 km!

Portal da Amazônia, saindo do estado do Mato Grosso e entrando em Rondônia

Estradas do sertão, retas longas e planas, sem movimento e bom aslfato.

16.12 – Porto Velho, RO – Humaitá, AM – Porto Velho, RO - 600 km
Como eu tinha conseguido adiantar um dia na viagem, estava a apenas 500kms de Rio Branco, tinha esse dia livre e decidi ir a Humaitá, AM, onde havia um trecho da famosa rodovia Transamazônica. O simples fato de entrar no estado Amazonas já é emocionante, ainda mais num jipe. Uma balsa a 10 km do centro de Porto Velho é responsável pela travessia do Rio Madeira e nos leva ao Amazonas. A estrada até Humaitá é asfaltada, e exceto algumas quedas de barrancos e pontes estreitas, não oferece maiores dificuldades. A chuva me acompanhou o trecho todo, algo aparentemente normal naquela região. Infelizmente não se vê matas lendárias com arvores gigantescas, apenas um cerrado pobre e muitas fazendas de gado as margens da rodovia. Humaitá é um povoado pequeno e simpático, também as margens do Rio Madeira, e de onde saem barcos e balsas para Manaus – cerca de 4 dias de viagem. Lá também começa o trecho de terra da Transamazônica, trecho ruim, com atoleiros e pontes caídas / precárias. Fiz apenas um pequeno pedaço dessa estrada, cerca de 50 km – a distancia total até Manaus é de 700 km. Pelo trecho que peguei, posso dizer que ela não parece ser intransponível, como muitos dizem por ai – talvez seja apenas no trecho que peguei, não sei se é possível por ali julgar o estado da estrada. O destino da expedição era outro, a cordilheira e o pacifico, então fiz meia volta, deixando a Transamazônica pra trás, com a curiosidade satisfeita e alguns quilos de lama grudados na carroceria do jipe. Voltei a Porto Velho no final do dia.

Entrando no Amazonas, emoção pra qualquer jipeiro que se preze !

Trecho da rodovia Transamazônica, entre Humaitá e Manaus.

17.12 – Porto Velho, RO – Rio Branco, AC - 500 km
Pela manha caminhei pela cidade até a estação de ferro Madeira Mamoré, onde se encontra um museu. Eu esperava mais do museu, acabei me decepcionando um pouco. O fato de estar dentro da estação e com algumas locomotivas da época deixa tudo mais interessante. Mandei lavar o jipe, pois tava de lama até no teto, e depois do almoço segui pra Rio Branco, AC.

18.12 – Rio Branco, AC – Puerto Maldonado - 570 km
A idéia era ir até a fronteira apenas, seriam 300 km de asfalto até Assis Brasil, AC, no entanto cheguei cedo na fronteira (apesar da forte tempestade que peguei no caminho). Tentei cruzar pela ponte (Assis Brasil – Iñapari), mas ela apesar de estar quase pronta, ainda não havia sido inaugurada e não foi permitido atravessar por ali. Desci pra margem do rio, onde pequenas balsas levam e trazem pessoas e carros de um lado pro outro. Como estava de jipe e eu já tinha lido relatos de carros que quase caíram das precárias balsas, a idéia de atravessar por dentro do rio foi irresistível. Devidamente instruídos por uns taxistas, atravessei o rio que tinha pouco mais de 1 metro de profundidade. Foi legal! Uma maneira pouco convencional de entrar em um país! Pena que não foi possível tirar foto alguma da travessia, a atenção era toda pro jipe e pro rio que se cruzava! Depois de cruzar o rio, apenas 200 km me separavam de Puerto Maldonado – A estrada estava boa, toda cascalhada e plana, em cerca de 3 horas estava na cidade.
Ao chegar a Puerto Maldonado me deparei com uma travessia de balsa, já estava anoitecendo, não tinha nem um centavo sequer em “soles” o dinheiro peruano nos
bolsos. Felizmente apareceu taxista que não apenas pagou nossa travessia, como me acompanhou ate uma casa de cambio e ao hotel que tinha selecionado. Gente fina !

19.12 – Puerto Maldonado – Marcapata - 280 km
Enfim comecei a deixar a Amazônia pra traz e subir a cordilheira. A paisagem vai aos poucos mudando, curvas aparecem, a estrada se estreita, algumas montanhas com arvores gigantescas, uma mescla de Amazônia e cordilheira que jamais tinha visto. A estrada, antes cascalhada, plana e larga tornou-se um problema. A velocidade era baixa durante todo o percurso, pois as pedras eram grandes no caminho e acelerar ali destruiria até mesmo o jipe. Inúmeras travessias de pequenos rios com muitas pedras e a altitude ia aumentando. A idéia era dormir em Quincemil, mas os hotéis que havia na cidade não eram nada acolhedores, feios e sujos... enfim, resolvi seguir mais alguns quilômetros até a cidade de Marcapata... a cidade não chegava nunca ! 70 km naquelas condições chegam a levar mais de 4 horas. A altitude aumentava bastante, já passava dos 3.000 metros e a Amazônia definitivamente tinha ficado pra trás. Decepção quando cheguei a Marcapata, era bem pior que Quincemil...nem hotel tinha ! Dormi no carro mesmo, afastando cerca de 10 km da cidade e encontrei um lugar seguro e tranqüilo pra dormir – a 3200 metros de altitude e as margens de uma corredeira. Durante a noite a temperatura chegou a 7 graus, o céu estava estrelado e uma dose de whisky me ajudou a dormir tranquilo.

Uma das muitas travessias de riachos no trecho peruano da Rodovia do Pacifico.

Estrada passa por dentro de uma linda cachoeira

20.12 – Marcapata – Cuzco - 200 km
As 05:00hs da manha o sol nascia, um lindo vale se revelava e acordei para fazer o ultimo trecho ate Cuzco. Continuei a subir a cordilheira, cheguei a 4.700 metros e conheci a mais linda estrada e a mais linda travessia da cordilheira que já havia feito ! Um verdadeiro sonho! Lhamas e alpacas me cercavam !Perto das 14:00hs
cheguei a Urcos, onde acaba a terra e os últimos 50 kms de asfalto até Cuzco. Que alivio rodar no asfalto depois de 2 dias e ½ chacoalhando nas estradas de pedra!

Amazônia ficou pra trás e a imponente cordilheira aparece.
Lhama na cordilheira
Cordilheira... ahhhh a cordilheira !

21.12 – Cuzco
Um passeio a pé pela cidade, artesanatos, a catedral, a praça de armas. Caminhei por todo o centro histórico, entre muros incas e construções dos colonizadores espanhóis. A tarde fui ao museu inca – maravilhoso ! Foram duas horas de aula de historia da melhor qualidade!


Lhama próximo a muros incas em Cuzco

22/12 – Machu Picchu
Solstício de verão !!! O dia mais longo do ano, visitar Machu Picchu nesse dia é no mínimo um privilegio. Peguei o trem em Cuzco as 06:00hs, 4 horas depois estava no Pueblo Machu Picchu – que mudou de nome a poucos anos, e eu mesmo conhecia pelo nome de Águas Calientes (quando estive durante uma aventura de moto pelo Peru em 2002). O Pueblo fica ao pé da cidadela perdida dos Incas – Machu Picchu. Depois de mais 15 minutos no micro ônibus, estava curtindo a cidadela. Delicia! Linda! Passeei por tudo, os templos, as moradias, conheci os rituais e mais um pouco sobre essa fascinante civilização, que em tão pequeno espaço de tempo (pouco mais de 100 anos), foi capaz de construir um império tão grande. Fiquei fascinados ao saber de seu conhecimento astronômico e de sua relação com a natureza. E claro, chocado ao conhecer os detalhes do fim do império Inca, pelas mãos dos colonizadores espanhóis. As 16:00hs o trem partiu de volta a Cuzco.

23/12 Cuzco
Passeei o dia pela cidade, fui até a imigração para carimbar o passaporte, pois pela fronteira que tinha cruzado (Assis Brasil – Iñapari) não encontrei aduana e acabei por ficar ilegal no Peru durante esse período. Consegui acertar a documentação no meio de uma correria, pois era véspera de natal e a imigração funcionava apenas até as 10:30hs, foi uma correria pra recolher uma taxa no banco e voltar pra carimbar o passaporte ! Me informaram que pro carro não seria necessário fazer documentação nenhuma (internação). Eu sabia que isso não estava certo, pois tinha entrado de moto no Peru anos antes e tinha feito toda uma documentação.
De qualquer forma, decidi deixar esse assunto pra resolver na fronteira, na hora de sair do Peru e entrar no Chile. A tarde fiz um city tour bem legal, o motorista do ônibus era simplesmente o Papai Noel!!!

24/12 Cuzco – Nazca – 600 kms
Essa rodovia, que liga Cuzco a Nazca passando por Abancay é sem duvida uma das estradas mais lindas – e perigosas que existe na América do Sul. Recentemente asfaltada oferece certo conforto e nos permite desfrutar de sua exuberante paisagem! A Cordilheira é muito imponente nessa região, Cuzco está a 3.200m de altitude, e comecei logo a subir mais e mais naquela estrada estreita e repleta de curvas. Começou a chover – me alegrei, pois sabia que a combinação de chuva e altitudes elevadas resultaria em neve. Neve em véspera de natal é um sonho! A temperatura baixava rapidamente, com o aumento da altitude, quando o termômetro aproximava-se de 0 a neve começou a cair. De inicio era pouca neve, mas em pouco tempo tudo foi ficando branco. Parei, desci, fotografei, brinquei como criança. Aos poucos o jipe foi ficando todo coberto de neve e no asfalto já havia um acumulo de cerca de 20 cm de neve!
Segui viagem – fascinado – porém nem tudo eram flores, e cerca de 15 km de Púquio, o jipe começou a ficar fraco, perder desempenho. Cheguei a pensar que era pela altitude, porem ficava e mais fraco e de repente um ruído forte! Desliguei a ignição e pisei na embreagem, consegui seguir descendo – com o motor desligado – até onde foi possível, consegui chegar a Púquio. O carro não pegava mais e eu desconfiava que algo serio teria acontecido com o motor. Já passava das 6 da tarde, dois mecânicos olharam o carro, imaginando ser algum problema de entrada de ar no motor, que uma simples sangria resolveria, mas nada ! o motor estava realmente quebrado ! Fazia muito frio, estava muito úmido apesar de não nevar mais ali, era noite de natal – Púquio certamente não era o sonho de consumo pra passar aquela noite, a cidade é minúscula e não tem estrutura nenhuma.
Pedi ajuda pra policia – os guardas foram extremamente educados e prestativos, me ajudaram a parar um caminhão que por ali passava, pediram para levar meu carro até Nazca, a cerca de 100 kms dali e que seria meu destino. Nazca é uma cidade pequena, mas eu já conhecia e sabia que pelo menos hotel descente e alguma chance de conserto teria ali. Era um caminhão baú, tive um pouco de trabalho pra colocar o jipe lá dentro. O guincho elétrico ajudou bastante ! Afinal de contas o motor não funcionava. Cheguei a Nazca as 02:00hs da manhã. Exausto. Ainda havia que descarregar o jipe e trazê-lo rebocado pelo caminhão até a garagem do hotel.

Rodovia entre Cuzco e Nazca.


Mais neve !

25/12 – Nazca
Domingo de natal. Ainda assim consegui um mecânico que pela manha foi ao hotel e tentou fazer o jipe funcionar. A esperança é a ultima que morre. O mecânico checou tudo que os outros 2 tinham checado na noite anterior em Púquio, sangria, alimentação de combustível, algum filtro entupido – tudo estava em ordem, mas o motor não funcionava. Ele desconfiava que algo tinha de errado com as válvulas, talvez o motor tivesse fora de ponto. Rebocou o jipe até a oficina, que ficava a 4 quadras do hotel, pra tentar algo mais, pois ali teria mais recursos. A oficina era muito feia – chão de areia e telhado de palha trançada.
No final da tarde ele até conseguiu fazer o motor funcionar, mas o ruído metálico era forte e tudo levava a crer que o motor estivesse realmente quebrado. Mas como podia, um motor diesel reconhecidamente forte, quebrar com menos de 30.000 km? Enfim, não havia o que fazer a não ser autorizar a desmontagem – abrir o motor para saber realmente o que tinha acontecido, e então procurar alguma forma para solucionar o problema.

Oficina onde o jipe foi desmontado em Nazca !

26/12 – Nazca
As 09:00hs fui até a oficina para ver como estava o jipe, me surpreendi ao ver que já estava quase todo desmontado. Mais algumas horas e o motor já estava fora do carro, e pouco tempo mais ele já estava todo aberto em uma bancada adaptada. Feita a autopsia (me permito usar este termo, pois o jipe encontrava-se morto naquele momento), as conclusões: - 1 camisa e 1 pistão quebrados, 2 outras camisas querendo quebrar (rachadas). Tentamos conseguir as peças no Peru, mas não foi possível, apesar de haver 2 revendas MWM em Lima, nenhuma delas possuía peças para o motor usado no Troller – motor sprint – segundo eles pouco comum no Peru. Tentamos também nas concessionárias chevrolet (pois o motor é o mesmo usado nas Blazer e S10 diesel), mas não nas vendidas naquele pais... O motor diesel das S10 e Blazer lá, provavelmente importadas de outro pais, não eram MWM. A mesma coisa na Nissan (cujos motores de X-Terra e Frontier são iguais ao do Troller no Brasil), mas foi em vão. Não havia alternativa então. O motor estava aberto, tudo desmontado, resolvemos pedir pro amigo Adriano Américo, justamente o sócio da Motorfort 4x4 que denomina essa expedição, amigo de infância, incentivador, jipeiro e mecânico de mão cheia, que comprasse as peças no Brasil e me enviasse na encomenda urgente via DHL.

Motor desmontado !

27/12 – Nazca
Falei com o Adriano pela manhã e a boa noticia era que as peças já haviam sido compradas e despachadas por ele mesmo diretamente no escritório da DHL em Campinas e que no máximo em 3 dias estaria em Nazca ! Restava torcer para que esse prazo se realizasse, ou talvez com um golpe de sorte fosse até mesmo menor que o prometido. Uma vez com as peças em mãos, o carro seria montado em 1 dia apenas, previa que entre sexta e sábado (dias 30 ou 31/12) estaria seguindo viagem.
Depois do café da manhã sai para sobrevoar as linhas de Nazca – Fascinante! Apenas fazendo-se o sobrevôo é que se tem uma noção do que aquilo representa. Fotos e relatos não conseguem transmitir mais do que 50% do que se vê ali de cima.
Segundo estudos científicos, as linhas de Nazca te cerca de 1.500 anos, foram feitas com poucas ferramentas rudimentares. As linhas e figuras nada mais são do que pedras afastadas manualmente, expondo-se o solo arenoso da região. Pela ausência quase total de chuvas e pela ação limpadora dos ventos, aquele patrimônio é mantido através dos séculos. A área onde se encontram as figuras é enorme – com cerca de 50 km de comprimento por 20 km de largura.

Linhas de Nazca – Colibri
Aqui nota-se a grandeza das figuras, comparadas com a rodovia pan-americana

28 e 29/12 – Nazca
Em compasso de espera, acompanhando a encomenda pela Internet e torcendo para que chegasse logo. Fiz um tour chatíssimo pela região. Nazca é um lugar legal para se passar 1 dia, sobrevoar as linhas e seguir viagem pelo Peru, alias, esse era o roteiro que pretendia fazer, mas infelizmente pelas circunstancias acabei me abrigando ali por algum tempo. No tour visitei a casa onde viveu Maria Reich – estudiosa das linhas de Nazca – visitei as linhas propriamente ditas, e pudemos comprovar o que nos haviam dito, que as linhas somente eram vistas por cima (avião), que da terra não era possível vê-las e sequer percebê-las ali, mesmo que alguém estivesse informando que ali naquele ponto estava tal figura. As figuras são gigantescas (algumas com mais de 300 metros de comprimento), portanto apenas a alguma distancia do solo é que se pode vê-las. Curioso isso quando nos lembramos de que elas foram feitas a cerca de 1.500 anos! Visitei também os aquedutos, que eram e ainda são responsáveis por trazer água de poços para a região da cidade.

As linhas vistas do solo.

30/12 – Nazca
Acompanhando pela Internet a encomenda, verifiquei logo cedo que as peças estavam em Lima e passariam pela aduana. Liguei pra DHL, pediram o numero do
passaporte para agilizar o desembaraço e informaram que na manha seguinte as peças seriam entregues em nosso hotel.
Deixamos tudo organizado pra montar o motor e o carro o mais rápido possível, apesar de ser sábado dia

31/12 e domingo dia 01/01, os mecânicos se comprometeram a trabalhar nesses dias a fim de entregar o carro e me permitir seguir com a expedição. Me alegrei com essa expectativa !
Final da tarde liguei novamente pra DHL em Lima para confirmar a entrega, perguntar o horário e de certa forma solicitar mais urgência em nossa encomenda, mas a reposta que me foi dada serviu como um balde de água fria: Primeiro nos disseram que a alfândega havia taxado as peças em U$ 343.00, que deveriam ser pagos para retirar as peças. Depois a pior das noticias, que eles não tinham se dado conta que a entrega era em Nazca, que a pessoa que havia dado a informação pela manha estava enganada e que a encomenda seria entregue apenas na segunda feira, dia 02/01. Seriam mais 3 dias perdidos !
Então surgiu a ideia de ir buscar as peças em Lima e assim foi feito. Peguei a 01:30hs da manha o ônibus pra Lima (7 horas de viagem).

31/12 – Nazca – Lima – Nazca - 1.000 km
A viagem de ônibus até Lima foi muito tranqüila, era um confortável ônibus leito “doublé deck”. As 07:30hs estava na porta da DHL, as 09:00hs fui atendido e ainda aguardei por mais 30 minutos até que a encomenda chegasse. Enfim as peças! Que alegria! Imediatamente peguei um táxi e fui pra rodoviária, peguei um ônibus pra Ica, cidade a cerca de 100 km de Nazca, onde seria feita a retifica do motor. O mecânico de Nazca, Sr Rudy, estava em Ica na retifica procurando segurar os funcionários da retifica, que por ser o ultimo dia do ano queriam ir embora, para fazer minha retifica ainda naquele dia.
A viagem demorou demais, o ônibus era bem diferente daquele da noite anterior, um legitimo “cata inka” que parava a cada moita da estrada. A viagem demorou quase 5 horas, e quando cheguei a Ica a retifica já havia fechado! Junto com sr Rudy, tentei de toda forma encontrar o dono da retifica, para implorar que o serviço fosse feito naquela tarde, mas foi em vão. Junto com Sr Rudy e as peças, peguei um terceiro ônibus – esse sim bem pior que os outros 2 – até Nazca. Chegamos ao final da tarde.
Passei a virada do ano no hotel, ceia, champanhe, pisco... Tudo era festa! Decidi deixar o carro lá em Nazca e seguir viagem, pois não adiantava mais ficar lá, as peças já haviam sido entregues ao mecânico e me restava apenas aguardar.

Hotel em Nazca

Reveillon em Nazca !

01/01 – Nazca – Arequipa - 600 km
As 15:30hs embarquei no ônibus pra Arequipa, que fica a cerca de 500km ao sul de Nazca. As 18:30hs o ônibus fazia a única parada prevista, onde seria servido um jantar. Logo vi ferramentas, compartimento do motor do ônibus aberto, pessoas rodeando... Só me restava mesmo era rir !!! Até o ônibus havia quebrado. Não tive a curiosidade de ver o que tinha acontecido, mas possivelmente conseguiram consertar e por volta das 20:00hs voltamos pra estrada. A previsão de chegada a Arequipa era pras 23:00hs, mas acabamos chegando as 02:30hs da manhã. Peguei um táxi que me levou por vários hotéis na região central de Arequipa. Todos eram “½ boca”, acabei ficando num deles, banho frio!

02/01 – Arequipa
De manha procurei outro hotel, liguei e havia vaga, peguei um táxi e troquei de hotel. Agora sim, esse era confortável e ficava muitíssimo bem localizado, na Praça de Armas de Arequipa!
Aluguei uma Hilux 4x4 e defini que iria a Puno (lago Titicaca) na manhã seguinte. Um caprichado jantar de 1º. de ano, nas varandas do segundo piso do hotel, com uma vista lindíssima pra Praça de Armas e pra Catedral de Arequipa... uma delicia !

Praça de Armas de Arequipa, o hotel

03/01 – Arequipa – Puno – Arequipa - 600 km
Sai as 06:30hs rumo ao Lago Titicaca, são apenas 300 kms de distancia, tudo asfaltado, mas cruzando a cordilheira – partindo dos 2.400m de altitude onde está Arequipa, atingindo 4.700m na cordilheira e recuando para 3.800m no Lago Titicaca. Essas travessias sempre são demoradas, curvas, visual legal, altitude, frio e às vezes neve!
A cerca de 40 km de Arequipa, fui parado por um controle policial, o guarda pediu documentos e depois de alguns minutos disse que teria que me multar e apreender o carro, pois no documento havia indicação de ser aquela uma pick-up “baranda” (era como ele pronunciava, devia ser algo como “varanda” imagino), ou seja, de carroceria e portanto cabine simples, enquanto o correto seria estar no documento a indicação pick-up “doble cabina”. Tentei todos os argumentos possíveis, desde o mais simples e obvio, que tratava-se de um carro alugado e que eu como turista não tinha culpa nenhuma e nem obrigação de conhecer sobre documentos peruanos, ainda mais por ter alugado o carro numa Avis não em qualquer locadora de fundo de quintal – mas não adiantou – então resolvi contar toda a historia da aventura pro guarda, desde a travessia pelo rio pra entrar no Peru, a quebra do carro, atraso das peças e toda a onda de azar que me perseguia. Mas também não adiantou. Então, veno que nada mais podia ser feito e me vendo em situação desfavorável novamente, sugeri ao guarda que podería colaborar com a gasolina da viatura. Valor rapidamente estipulado em 50 soles (cerca de US$ 20) e fui autorizado a seguir viagem. O guarda fez questão de salientar que lá não existe esse habito de aceitar ajuda, mas tratava-se de um caso especial, éramos turistas e afinal de contas a contribuição era para a gasolina da viatura...  (concordei imediatamente!)
Essa estrada, a exemplo das outras travessias de cordilheira peruanas é linda. Por todo o trajeto havia a companhia dos trilhos de uma ferrovia, atravessei uma reserva nacional, onde vivem as vicunhas e alpacas, tudo muito lindo!
Pouco antes de chegar a Puno, passei por uma cidade chamada Juliaca – me senti no Vietnã. Havia chovido, existiam poças de lama gigantes pelas ruas da cidade. Bicicletas com 3 rodas levando 3 pessoas estavam por toda parte, o transito era desordenado e barulhento, pelo uso excessivo das buzinas !
Errei uma rua no centro de Juliaca e cai na contramão. Tive que manobrar a pick-up sob uma salva de buzinadas histéricas. (já havia passado por Juliaca em 2002, de moto e o cenário era o mesmo! eita cidade feia!)
Consegui sair dali e peguei a estrada novamente, estava quase chegando a Puno.
A cidade, Puno, também é horrível – fica na encosta e mais parece um favelão do que uma cidade. Entretanto existem 2 hotéis legais na cidade, as margens do Lago Titicaca, pra um deles rumei e ali almocei e curti algumas horas as margens do grande lago. Titicaca é o lago navegável de maior altitude no mundo (3.800m) e serve de divisa entre Peru e Bolívia.
Havia combinado com o mecânico que as 12:00hs ligaria pra ele em Nazca pra saber como andava o conserto. Não consegui falar com ele, tentei mais 2 ou 3 vezes sem sucesso.
Almocei truta as margens do grande lago, logo mais segui de volta pra Arequipa. A volta foi ainda mais linda que a ida, pois começou a chover, e logo estava nevando novamente!
Antes das 18:00hs estava de volta a Arequipa, devolvi o carro e contando o “incidente” com a policia ainda consegui um abatimento de 50 soles na tarifa de aluguel do carro.
As 20:00hs consegui falar com Sr Rudy, o mecânico, e ele disse que o motor já havia retornado da retifica e que no dia seguinte começariam a monta-lo no carro.
Fiquei um pouco preocupado, pois ele disse que a retifica afirmou ter sido falta de pressão do óleo lubrificante a causa da quebra, Sr Rudy disse que após montado o motor ele ia verificar a pressão de trabalho do óleo para saber se tinha alguma coisa errada com a lubrificação. Puxa vida!!! Mas ele mesmo tinha dito que agora era só montar o motor... Como pode haver duvida de algum outro problema?... Restava torcer pra não ser nada grave.
Combinamos de falar novamente ao telefone as 16:00hs do dia seguinte, e se estivesse tudo ok, pegaria o ônibus naquela noite para ir a Nazca buscar o carro, retomando a viagem na quinta feira cedo.

Entre Arequipa e Puno

Juliaca – lembra Vietnã
Casas de “totora” no lago titicaca
Lago titicaca ao fundo.
Mais um pouco de neve na volta pra Arequipa.

04/01 – Arequipa
Fiquei o dia todo pela cidade, passeei bastante a pé. No final da tarde falei com Sr Rudy por telefone e o mesmo disse que o carro estava “quase montado” e que eu poderia viajar naquela noite pra Nazca e buscar o carro. Dito e feito, comprei a passagem. Naquela noite peguei o ônibus pra Nazca.

05/01 – Arequipa – Nazca - 600 km
Passados alguns quilômetros havia um acidente na pista e o ônibus ficou parado por umas duas horas, eu não me preocupei muito pois era um confortável leito e o horário previsto pra chegar em Nazca era 04:30hs da manhã, qualquer atraso seria bem vindo – chegar pela manhã seria bem melhor que de madrugada.
Passado o acidente, ainda que meio sonolento, notei que o ônibus andava muito devagar na rodovia, talvez em primeira e segunda marchas apenas. Por vezes parava um pouco no acostamento, por vezes seguia devagar. Percebia que vez ou outra passava outro veiculo mais rápido, sinal que a estrada não estava bloqueada, comecei a ficar preocupado e desconfiar de um assalto no ônibus ! Eu tinha um bom dinheiro comigo, para pagar o serviço do mecânico. Mais algum tempo nesse ritmo e logo entra uma pessoa na cabine e anuncia que o ônibus estava quebrado, mas que já havia outro ônibus da mesma companhia atrás e nos levaria ao destino. No entanto o outro ônibus já tinha passageiros. Não havia onde sentar. Acabei me acomodando sobre a mesinha de jogos, onde dormi o resto da noite. Pela manha estava em Nazca, corri até a oficina e qual não foi minha decepção ao ver ainda o motor sobre a bancada. Eles estavam com dificuldade em montar o cabeçote do motor, diziam que precisavam de uma ferramenta especial que apenas a MWM teria. Falei com Adriano por telefone, ele se informou sobre a ferramenta e até mesmo no Brasil ela é comprada apenas sob encomenda, levando alguns dias, além de ser caríssima. Passamos o dia inteiro tentando pesquisar na Internet como seria essa ferramenta e tentando confecciona-la usando uma morsa, alguns pedaços de aço e uma solda elétrica. No final do dia tínhamos a ferramenta pronta e deixamos pra montar o cabeçote no dia seguinte. Apesar de cansado, abalado e desanimado, ainda restava um pouco de esperança, afinal o motor tava pronto, diversas etapas haviam ficado pra trás – achar o problema, receber as peças, fazer a retifica...era a reta final, bastava montar a tal engrenagem, fechar o cabeçote, colocar o motor pra dentro do carro novamente, regular, ligar, partir !!!

Até o ônibus quebrou !
Jipe ainda internado na oficina em Nazca. Oficina de primeiro mundo ?!

06/01 – Nazca
Conseguimos montar a engrenagem no cabeçote e eles seguiram montando o motor no carro, eu tinha me preparado para ir a Nazca, buscar o carro e voltar pra Arequipa – tinha apenas a roupa do corpo, que ficou imunda pela sujeira da oficina !! Passou o dia todo até que o motor estivesse instalado. Conseguimos faze-lo partir ! FUNCIONOU !!! No entanto, conforma Sr Rudy havia me sugerido pelo telefone, deveríamos verificar a pressão do óleo, para evitar outra quebra. Ele instalou um manômetro ali mesmo, sob o capô, e descobrimos que a pressão do óleo era baixa demais, as vezes chegava a ficar totalmente sem pressão, as vezes ficava com pressão baixa demais. No entanto, consultando no manual do motor, na Internet e por telefone com o Adriano, descobrimos que esse motor trabalha com valores de pressão bem abaixo dos valores que os motores antigos – os quais Sr Rudy está acostumado a consertar ali – trabalham. Alegres, eu e Sr Rudy saímos pra um teste com o carro, e nosso desapontamento foi grande ao sentir o motor quase travar por 4 vezes (o motor ficava pesado e chegava a morrer, mas partindo logo em seguida). Voltamos pra oficina com cuidado, verificamos o nivel do óleo e estava baixo demais, ele colocou mais 3 litros e o carro parou de travar. Já era noite, fomos dormir, deixei o carro na oficina pra na manha seguinte fazermos a ultima verificação e encerrar o serviço.

07/01 – Nazca
Logo cedo estava lá, ligamos o carro e pra nossa surpresa não havia novamente pressão no óleo ! Passados alguns minutos a pressão apareceu, meio instável. Seguimos montando os filtros, tiramos o manômetro de pressão e voltamos a ligar a luz de pressão do óleo do painel, vedamos com silicone o filtro de ar e etc, acertei a conta com eles, me despedi de todos, agradeci e fui partindo... a luz do óleo no painel voltou a acender ! Voltei pra oficina – agora sim chateado – eles tentaram desmontar mais alguns itens, válvula de óleo, falavam sobre a bomba... mas foi ai que descobri que não adiantava mais tentar nada naquelas condições. Segunda feira, dia 09, se aproximava, eu deveria voltar ao trabalho naquele dia, ainda faltavam 5.200kms de estrada para chegar a SP, o motor apesar de todo refeito, indicava através da luz que algo ia mal, eu não tinha confiança em assumir essa distancia toda, através do deserto, com o carro naquelas condições. Também não tinha confiança que algo se resolveria naquela oficina. Resolvi encerrar os trabalhos, levar o carro até o hotel, pedir para deixa-lo guardado ali e voltar pro Brasil de avião. E assim foi feito.

08/01 – Nazca – Arequipa - 600 km
A tarde peguei o ônibus pra Arequipa,. Era domingo à noite, e consegui vôo apenas pra terça feira cedo, portanto passaria ainda a segunda feira ali.

09/01 – Arequipa
Aproveitei o dia pra arrumar as bagagens – quase 70 kg que trouxe para o Brasil – passear por Arequipa, fazer algumas compras e etc. Peguei a passagem e fui descansar pra viajar na manha seguinte.

10/01 – Arequipa – Lima – SP  ( 6.000 km - avião )
Logo pela manha peguei o voo em Arequipa para Lima, e rapidamente outra conecção pra São Paulo. Pela janela do avião eu via o deserto, vez ou outra via a rodovia pan-americana – apenas um risquinho negro em meio a tanta areia, uma imagem realmente impressionante! – e pensava na vez que havia passado ali mesmo, em cima de minha moto, e nada tinha acontecido. Agora, num jipe – teoricamente mais robusto e bem equipado – com ferramentas, estepe, guincho, fluidos e peças em reserva... Dessa vez o deserto havia me vencido! Cheguei ao aeroporto de Guarulhos na noite daquela terça feira – meu pai e minha mãe estavam ali me aguardando! Fiquei feliz em voltar pra casa. Porém, sabia que a expedição não tinha terminado ali, que ainda haveria outro capitulo – O
Resgate do jipe quebrado!

Rodovia Pan-americana vista desde o avião.
Lago Titicaca visto desde o avião.

O RESGATE!!! 

02/02 – São Paulo - Lima ( 5.000 km - avião )
Depois de alguns dias tentando alternativas diversas para trazer o carro de volta ao Brasil, desde levar um mecânico, consertar e voltar rodando – pensei também em contratar um caminhão “prancha” pra ir buscá-lo, pensei em ir com o caminhão da minha empresa, em ir com uma Pick-up  e voltar com o jipe rebocado, cheguei a conseguir uma cotação numa transportadora – US$ 10,000 !!!! Mas por fim, encontrei (através de um amigo de meu pai) a Transportadora AMERICA, que é especializada em transporte de veículos pela América do Sul e estava justamente fazendo uma viagem inaugural á Lima, num comboio de 6 carretas que levavam 6 chassis de microônibus cada uma, e voltariam “batendo lata” de Lima até o Brasil !!! Perfeito! Pra melhorar ainda, se prepuseram a fazer o transporte em cortesia. Romeu e seu filho João, os donos da transportadora, foram muito atenciosos por telefone e se dispuseram a ajudar em tudo que fosse possível – realmente ajudaram! Porém, havia entrado no Peru por uma fronteira não controlada, não tinha documentação de entrada do carro, achei que os motoristas teriam problemas enormes para sair com um carro de terceiro de um pais, onde sequer ele teria entrado oficialmente. Seria o ideal se eu estivesse junto para cruzar as fronteiras, explicando pessoalmente sobre a entrada irregular e apresentando meus documentos de proprietário do veiculo. Estando o veiculo quebrado e acompanhado do proprietário, concluímos ser mais fácil atravessar as fronteiras, caso contrario ele seria considerado carga, e acabaria indo parar na aduana !
Bem, o comboio da Transportadora América estava chegando a Lima nesse dia, 02/fev uma quinta feira, pela manha. Consegui um vôo de SP para Lima e as 12:20hs eu estava no lugar combinado, um porto seco na região chamada Callau, segundo consta é a zona portuária e a região mais perigosa de Lima. No entanto ali não havia o menor sinal dos caminhões. Não havia onde ficar, haviam muitos guardas na porta, era uma avenida movimentadissima – carretas e containeres pra lá e pra cá a toda hora, não me deixaram entrar, fiquei ali mesmo, sentado na calcada sob um sol forte, esperando que a qualquer momento os 6 caminhões com placas do Brasil virassem a esquina ! Mas isso não aconteceu. Até as 17:00hs fiquei ali, quando então consegui comunicar-me com o Romeu e recebi a informação que as carretas não estavam ali, não tinham nem chegado a Lima ainda, estavam num pedágio da rodovia Pan-americana, cerca de 20km ao sul de Lima. Eles tinham recebido recomendações da policia para não se aproximarem do porto naquele horário, pois era uma região perigosíssima a noite, e que deixassem pra descarregar na manha do dia seguinte.
Aníbal, o representante da América em lima, apareceu pra me buscar... UFA! Fomos ao encontro dos motoristas. Logo os encontramos, que alegria, seguimos com eles até um posto de combustível onde eles pernoitaram, agendamos a descarga para o dia seguinte as 08:00hs. A frota impressiona, são 6 carretas Mercedes Benz 1944S, praticamente zero km, com 440hp cada, 22,40 metros de comprimento, especialmente projetadas pra longas viagens.
Voltei com Aníbal pra região central de Lima, e me hospedei num hotel, jantei no Burger King... Talvez fosse a ultima vez que dormiria numa cama nos próximos dias..

03/02 – Lima
Logo cedo coloquei uma bermuda e camiseta pra junto com Aníbal ir ao porto seco, onde os caminhões estariam. Logo que chegamos, vimos que os caminhões já tinham entrado e aguardavam em uma fila, algumas burocracias a presença do fiscal liberaria a carga. Um dos “chapas” que estavam do lado de fora, informou que de bermuda não entraria ali, e no carro mesmo voltei a colocar a calca jeans – bem quente! Não há a menor comunicação entre “a rua” e os motoristas lá dentro, o porto é grande demais e ao longe via os caminhões. De repente eles apareceram, peguei minha bolsa e fui ao encontro deles, tentando entrar junto. Porém fui barrado pela segurança – apenas uma pessoa pode entrar por caminhão. Ali na portaria me disseram que o tramite de descarga e aduana as vezes leva 2 dias. Como eu estava incomunicável com os motoristas o que me restava fazer era... Sentar na mesma calcada da tarde anterior e esperar!!!
Sol forte... Que saudades da bermuda.. Meu pescoço e testa já ardiam, eu estava bem queimado, desidratado. Não podia sair dali pra nada, nem pra comprar um protetor solar, nem um refrigerante. Pois a qualquer momento minha “carona” podia sair por aqueles portões, eu tinha que estar ali. Não havia uma arvore sequer por perto.
Algo tinha que ser feito, troquei torpedos com o Romeu, e ele também não tinha comunicação com os motoristas, pois nenhum levava celular.
Fui novamente ate a segurança e tentei entrar, dessa vez tive sorte de encontrar o chefe da segurança, que não apenas permitiu minha entrada, como me acompanhou ate os caminhões. Naquele momento eu acabei me transformando numa espécie de porta voz dos motoristas, o chefe da segurança me perguntou se eu era supervisor da transportadora, e eu, por impulso respondi que sim – com medo que ele me colocasse pra fora de novo! Bem, agora como supervisor e notando que os chassis tinham sido descarregados, me restava apenas interceder pra tentar liberar as carretas e iniciar a viagem de volta. O próprio chefe da segurança chamou o fiscal responsável, e em poucos minutos conseguimos a liberação dos caminhões! O armazém alfandegário é de proporções descomunais, até mesmo trem passa ali dentro e mais de 500 carretas descarregam ali todos os dias. Os muros são altos e vigiados por guardas armados – afinal a região é perigosa. Estávamos liberados, peguei carona com o Zé Carlos, éramos o ultimo caminhão a sair, víamos todos a nossa frente, saímos do porto seco, entramos na avenida em frente ao armazém e passamos literalmente por um arrastão. Cerca de 10 ou 15 moleques invadiram as carretas, roubando tudo que estivesse ao alcance, ferramentas, diesel, estepe, extintor de incêndio e etc. Como o transito era lento não havia o que fazer, se parássemos e abríssemos a cabine, seriamos assaltados mesmo! Sem ter o que fazer, passamos o mais rápido possível por ali e fomos embora. Logo mais nos desvencilhamos do transito caótico de Lima (que torna-se um pouco mais complicado quando se está numa carreta daquelas
proporções) pegamos a rodovia pan-americana e seguimos para o posto, ainda próximo a Lima.
Havia o remonte para ser feito, colocar uma carreta vazia sobre a outra, para economizar combustível e pneus, numa volta para casa que tinha cerca de 4.000 km ate Uruguaiana, Brasil. O sol estava forte demais, definimos fazer mais a noite, mesmo porque a precária rampa que havia ali poderia ser usada apenas após as 18:30hs. Almoçamos um arroz com carne ao lado das carretas, descansamos e fomos fazer o remonte. Tentamos até as 21:00hs, mas não foi possível naquelas condições, a rampa era muito baixa. Tomamos um banho no posto de combustível, e resolvemos dormir e procurar um lugar melhor pra remontar na manha seguinte.
Fui pra carreta do João Alberto, Ele dormiu na cama que tem atrás dos bancos e eu dormi sobre os bancos e motor do caminhão. Não é absolutamente plano e nem muito macio, mas estava cansado e consegui dormir legal.

A frota
Zé Carlos

04/02 – Lima – Nazca - 500 km
Aos poucos fui conhecendo, conversando com todos os motoristas.
- Ribamar, um paraibano gente boa, mas esquentado, que viajava com sua esposa.
- Arquimedes, fisicamente idêntico ao Sr Benz, o chefe do pai do Bart Simpson no desenho. É o mais velho do grupo e o mais novo na empresa. Daqueles caras cheios de historia pra contar, e era o cozinheiro oficial da viagem. Ele também viajava com sua esposa.
- João era o mais novo do grupo, tinha 37a. gente boa, curtia um bom rock, viajamos curtindo The Eagles (hotel Califórnia), Supertramp, Led e outros... Companheiro nota 10!
- Zé Carlos com a mesma idade do Arquimedes era bem sossegado, quieto, e muito experiente. Conversando me contou que deixou de beber há 15 anos, mas era alcoólatra de carteirinha. Hoje em dia não molha nem o bico em cerveja – tem medo!
- Nelson é o negão. Gente boa e realmente merecedor do titulo de mais sossegado, ele realmente não curtia sujar as mãos, apenas dirigia. Nelson vive na carreta, não tem casa, não paga aluguel.
- Chimendes era o líder do grupo, Ele já tinha em uma ocasião levado ônibus ate o Equador e era o único que conhecia o trajeto. Apesar de ser novo na empresa (1 ano e ½) ele liderava com sabedoria a frota naquela viagem.
Depois de muito trabalho naquela manha, cerca de 4 horas sob sol forte, tínhamos terminado a remonta, a frota antes de 6 caminhões tinha se reduzido a 4, pois duas carretas e dois “cavalinhos” seguiam de carona nas outras 4.
No caminhão em que eu seguia com o João, foi carregado o cavalinho do Chimendes, e ele também viajou na nossa cabine.
No final da tarde estávamos em Nazca, sob chuva intensa (que durou a noite toda) buscamos o jipe no hotel e o rebocamos com o cavalinho até o posto de combustível onde dormimos, não sem antes comer um frango e arroz que o Arquimedes preparou, e claro, depois de ouvir bastante historia, abrigados da chuva sob a carroceria da carreta.

Remontando os caminhões
Chimendes na cama e João ao volante.
Zé Carlos, Arquimedes e eu, jantando sob a carreta (protegidos da chuva)
Essa era minha cama, o travesseiro era a mochila do João.
O jipe juntando-se ao comboio.

05/02 Nazca – arredores de Arequipa - 550 km
Carregar o jipe na carreta foi muito simples. Tiramos a bateria de um caminhão, fizemos uma chupeta no jipe e usando apenas o guincho elétrico (sem ligar o motor), em menos de 5 minutos tava tudo pronto! Amarramos bem e seguimos viagem.
A cerca de 100 km de Arequipa, o caminhão onde estavam Nelson e Zé Carlos chocou-se contra outro caminhão, numa curva. Nada grave, na verdade nem um risco no caminhão do Nelson, mas o bico da carroceria deles veio a rasgar uns 3 ou 4 metros do baú do outro caminhão. Foram umas 3 ou 4 horas parados, negociando com a policia e etc. No final prevaleceu o velho ditado “Em pasto alheio boi é vaca!”, e apesar de estarmos certos, acabamos deixando US$ 150 ali, sendo 100 pro outro caminhoneiro e 50 pra policia. Seguimos viagem, passamos por Camana e começamos a subir em direção a Arequipa. A serra é longa e perigosa. Por volta das 19:00hs resolvemos parar num posto, já era tarde e logo teríamos problemas com a policia se continuássemos na estrada, pois no Peru caminhões são proibidos de viajar a noite. O posto era precário, não tinha nada, ate mesmo a luz (tocada por gerador) apagou-se as 20:0hs. Não havia janta nem banho, os outros caminhões tinham ficado pra trás, nos restava dormir.


Acidente entre as carretas antes de Arequipa.

06/02 – Arequipa – Arica (Chile) - 450 km
Programamos o despertador pras 04:00hs da manha, porem ainda era noite fechada e resolvemos dormir até as 05:00hs. Fui dormindo atrás quase a viagem toda, até que ao meio dia chegamos a fronteira Peru x Chile, em Tacna. Eu tava muito apreensivo, pois não tinha o documento de entrada do troller e sabia que encontraríamos dificuldades para sair do Peru. Dito e feito foram 3 horas parados, ate que o chefe da aduana chegasse, tomasse conhecimento de nosso problema e para nossa surpresa, rindo pela falta de estrutura em iñapari ele nos liberasse de imediato. Que alivio.
Terminamos a documentação e fomos pra aduana chilena, a 500 metros dali. Não podíamos imaginar que ali começariam os problemas! Eles começaram a exigir documentos e mais documentos dos motoristas, encrencavam por estarmos levando caminhões remontados. Os motoristas já cansados começaram a sair do serio e conseqüentemente a perder a razão. Depois de muitas idas e vindas, concluiu-se que precisavam alterar o documento que havia sido feito a pouco no lado peruano. MIC é um Manifesto Internacional de Cargas, que cada caminhão de carga que viaje pela América do sul é obrigado a levar, acontece que esse documento foi preenchido de uma maneira (tratando os caminhões como viajando vazios, e apenas levando caminhões da mesma empresa sobre eles) e dão margens a interpretações diferentes em cada fronteira (por exemplo, no lado chileno eles diziam que mesmo sendo da mesma empresa, se estava um sobre o
outro, era considerada carga!). Ai, os caras ficam discutindo o sexo dos caramujos, empurrando de uma fronteira pra outra o problema. Fomos ao lado peruano novamente, alteramos a documentação e a deixamos exatamente como o oficial chileno havia pedido. As 21:00hs conseguimos sair de lá, seguimos até Arica – cerca de 30 km da fronteira, já no lado chileno – tomamos um banho gelado no posto, jantamos um miojo e fomos dormir.

Fronteira Peru x Chile
Nelson e Joao - Jantar em Arica (miojo)

07/02 –Arica – San Pedro Atacama. - 700 km
O dinheiro que os motoristas tinham levado não seria suficiente para chegar a Uruguaiana, não daria nem pro Diesel, então eles falaram por telefone com Romeu e em pouco tempo conseguiram com ele a autorização para ir buscar o dinheiro com um cliente da transportadora, porém o cliente ficava em Tacna, no lado Peruano – a cerca de 60 km dali.
Acompanhei Chimendes e João até Tacna, o único detalhe é que não podíamos ir com os caminhões, pela documentação, então fomos numa lotação mesmo !
Entre ida e vinda. Cambio do dinheiro, aduanas e etc acabamos chegando a Arica onde estavam os outros motoristas aguardando, apenas as 17:00hs. Porém a vontade de todos era chegar ao Brasil, comemos o resto do macarrão com sardinha que eles tinham comido no almoço, abastecemos os caminhões e, na gíria dos motoristas, “ganhamos a estrada”.
Saímos de Arica as 18:00hs, João e Chimendes foram se revezando na direção, e as 06:00hs da manha estávamos em San Pedro Atacama.

08/12 – San Pedro Atacama
A aduana abria apenas as 08:00hs, então aguardamos e as 08:00hs éramos os primeiros a ser atendidos. Apenas nosso caminhão havia viajado a noite toda e estava em San Pedro, os demais possivelmente teriam parado para dormir em alguma parte e ainda não haviam chegado. Para nossa surpresa, o que seria apenas uma liberação de saída do pais, acabou-se tornando num tormento. Argumentamos que a entrada no Chile havia sido conturbada e que fizemos a documentação exatamente como o oficial chileno nos havia pedido, e que agora para sair do Chile não podiam estar nos pedindo coisas diferentes. Mas na verdade eles estavam sim, e pouco se importavam com nossa documentação. Falavam inicialmente que tínhamos que ir até a aduana em Antofagasta, para regularizar a documentação e pagar uma multa, mas essa cidade fica a mais de 300 km de San Pedro. Argumentamos mais uma ou duas vezes, mas a sra da aduana era de poucos amigos e não queria conversa. Eu estava muito chateado, acreditando que o problema todo era por causa do jipe, já tinha ate sugerido que descarregassem o jipe e seguissem viagem. Na hora do almoço, junto com outros motoristas brasileiros que ali também estavam (de outras empresas), comemos um arroz carreteiro autentico, pois havia sido preparado por um carreteiro e embaixo da carreta! Por volta das 18:00hs os outros caminhões chegaram, e nos estávamos ali ainda, enrolados com a documentação e tentando de alguma forma nos livrar daquele pesadelo. Surpresa total foi que todos os outros caminhões também foram barrados ali, pois o problema não era com o jipe e sim com as remontas !!! Apenas por volta das 20:00hs ela nos disse que se a empresa América fizesse um fax com uma carta de correção para cada um dos caminhões, ela autorizaria a seguirmos. Fizemos um inferno, conseguimos localizar o Romeu naquela noite e ele pediu para que seus funcionários fossem ate a empresa para emitir tal carta de correção enviasse por fax. A aduana fechava as 23:00hs, e exatamente as 23:00hs nosso fax chegou. A Sra olhou, disse que parecia certo, mas que estavam fechando e que no dia seguinte poderiam analisar cuidadosamente a documentação. Dormimos ali na aduana mesmo, novamente sem banho!

Nelson em San Pedro de Atacama
Vulcão Licancabur em San Pedro de Atacama
“Nossa” carreta, com o jipe em cima, no deserto do atacama.

09/02 - San Pedro Atacama – Susques - 600 km
As 08:00hs da manha estávamos novamente apresentando documentação na aduana, logo de cara nos pediram pra providenciar 2 copias de cada carta de correção, curioso é saber que na aduana tinha maquina de xerox. Nos fizeram ir a pe ate a cidade, esperar ate as 09:30hs a abertura do xerox, para então voltar com as copias. Cerca de 1 hora mais tarde estávamos comemorando, pois haviam nos liberado. Até “Paso de Jama” foram 3 horas de viagem, mas a aduana lá estava fechada, pois era hora de almoço. Aguardamos um pouco e as 15:00hs fomos liberados. Em Jama faz-se apenas a parte da documentação pessoal de cada um (passaporte, imigração), a parte de documentação aduaneira dos carros é feita em susques a cerca de 160 kms dali. Seguimos e ao cair da tarde estávamos ali, entregando novamente a já rasurada documentação. Estávamos apreensivos, pois até então em todas as fronteiras tivemos problemas com essa mesma documentação. Mas por volta das 22:00hs estávamos liberados. Então, eu, Zé Carlos, João, Chimendes fomos jantar em um pequeno restaurante, porem muito gostoso!
Chovia e fazia muito frio, dormimos nos caminhões que estavam estacionados em frente a aduana, novamente sem banho ! Não havia sinal de celular e a cidade estava sem comunicação por telefone convencional também, restava dormir. Já estávamos na Argentina e bem mais perto de casa.

10/02 – Susques – Uruguaiana - 1.500 km
Partimos as 06:00hs para uma jornada de cerca de 1500 kms. Não haveriam mais aduanas, nem subidas e curvas da cordilheira, apenas longas, monótonas e quentes retas da região do “pampa Del infierno” no chaco argentino.
Partimos e logo na primeira hora de viagem encontramos o caminhão do Ribamar parado, ele tinha feito sangria no dia anterior e tinha deixado um bico injetor aberto, com isso o caminhão não andava direito. Estávamos a 4.000m de altitude no ultimo trecho da cordilheira, antes de Purmamarca e com cerca de 4 graus negativos. Bico consertado... Seguimos viagem, o dia todo e a noite toda...sem parar !

Ultimas curvas da cordilheira, antes de chegar a Purmamarca. (trecho que era todo sem pavimentação na ultima vez que eu havia passado, de moto....agora todo asfaltado!  sobrarão rotas de verdadeira aventura?)

11-12/02 - Uruguaiana – Porto Alegre – São Paulo (650 km ônibus / 1.000 km avião)
As 06:00hs, com 24 horas direto na estrada, nos aproximamos de Uruguaiana, quando o diesel acabou. Limpamos o que havia de diesel no cavalinho que estava sobre a carreta e também o diesel do jipe, ainda assim conseguimos parar um caminhão e compramos dele mais 20 litros, o que seria suficiente para chegar ao Brasil. Sangramos os bicos injetores, pois havia entrado ar na bomba, seguimos viagem e as 08:00hs estávamos em Paso de los Libres, o lado argentino da fronteira com Uruguaiana – bastava agora cruzar a ponte e estaríamos no Brasil, fim da viagem ! A transportadora América tem um despachante em Paso de los Libres, e esse despachante ao ver a documentação quase chorou ! Estava
realmente horrível... Havia diversas incorreções que podiam acabar por nos fazer perder alguns dias ali...
- em primeiro lugar, o documento foi emitido no Peru com numeração chilena.
- fora isso, o destino final da viagem era a ADUANA de Uruguaiana e não apenas Uruguaiana!!! Com isso possivelmente ficaríamos retidos ali na aduana, esperando por alguns dias ate dar canal verde ou vermelho, analise da documentação e etc
- sem contar a confusão toda que as aduanas haviam feito em todo trajeto.
Não havia mais o que fazer. A simples possibilidade de ficar mais alguns dias ali resolvendo esse assunto me apavorava! Eu perguntei ao despachante se “haveria outro jeito”, e graças a essa característica tão interessante do Brasil, em algumas horas e ao “custo” de 20 dollares, estávamos finalmente em Uruguaiana, no pátio da transportadora. Procurei um hotel onde pudesse tomar um banho, pois desde segunda feira (06/02) não tinha mais tomado banho nem trocado de roupa, descansei um pouco e as 22:00hs peguei o ônibus pra Porto Alegre, pra na manha seguinte pegar o avião para SP, minha mãe e meu pai me esperavam no aeroporto!

Essa certamente foi a mais inusitada, mais cansativa de todas as aventuras que já fiz pela cordilheira, e olha que não foram poucas. Logo dessa vez, que abria mão de viajar na “perigosa e indefesa” moto, com suas duas rodas, nenhum estepe e pouco espaço para bagagens, roupas e ferramentas... Passando a viajar no indestrutível jipe, com seu parrudo motor, repleto de roupas, ferramentas, peças...

...Voltei na boleia do caminhão

Quando voltei de viagem, contando as peripécias para amigos, um deles foi muito pontual: "Diego, você que rodou toda essa America do Sul de moto, sozinho, procurando sarna pra se coçar...: encontrou!!  não tem do que reclamar!!!"  ele estava certo, não havia do que me queixar. 

Uma coisa é certa, e ele não sabia: quase 10 anos depois e ainda há muita historia a ser contada!  That's life!

Matéria publicada na revista "Oficina Mecanica":


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